sábado, 20 de junho de 2009

- Milagre! A dona moça resolver chegar na hora certa né? - ela me recebeu com ironia - Se bem que faltando um minuto para a hora do expediente não é grande coisa!
- Boa tarde para a senhora também D. Grace! – eu retruquei.
- Cruz credo garota!! Dona! Pelo amor de Deus, eu já te falei milhões de vezes para não me chamar de dona! – ela disse. – Vai trabalhar vai, tem muita coisa para você fazer hoje!
Ela foi em direção a um grupo de garotas que estavam em dúvidas sobre que Cd comprar.
Eu suspirei, fui guardar a minha mochila que tinha atrás do balcão e comecei a lembrar dos meus bons tempos nessa loja, ou seja, quando a Grace ainda não era minha chefa.
Na verdade, a minha antiga chefa se chamava Simone, ou melhor, Simoninha, ela era muito amorosa e compreensiva comigo, um pouco baixinha, tinha longos cabelos que sempre mudava de cor – ela adorava pintar os cabelos – e não tinha um estilo, só usava roupas que ela via no armário e ficava com vontade de usar. Ela me deixava ficar ouvindo CD’s das bandas que eu gostava no meu walkman – sim, eu ainda tinha esse objeto pré-histórico - quando não tinha muita coisa para fazer e me dava altos conselhos sobre a vida. Ao contrário da Grace, que era muito mandona e incompreensível, era alta mas mesmo assim sempre usava um sapato alto com o salto fino, tinha um corpo escultural e só usava jeans apertados e camisas decotadas. Todos os meninos que entravam na loja ficavam babando por ela, e ela adorava isso. Grace, nunca me deixava ouvir Cd’s porque sempre arranjava algo para fazer como arrumar as prateleiras, contar quantos Cd’s ou DVD’s que haviam chegado, se tava tudo certo...
O dia em que Simone me disse que teria de vender a loja para outra pessoa foi muito triste, ela precisava do dinheiro para pagar umas dívidas que tinha e ir morar no Rio de Janeiro com o seu recém marido Paulo. Mas o bom disse tudo é que ela se mostrou ser realmente minha amiga, sempre ligava para perguntar como eu estava, se a minha nova chefa estava sendo legal comigo... é claro que eu mentia sobre a minha “nova chefa”, dizia que ela era muito amigável comigo. Eu mentia porque Simone ficou muito agradecida por Grace continuar a deixar a loja vender Cd’s, ter mantido o nome da mesma e, é claro, por ter deixado eu continuar no meu emprego assim como os dos outros funcionários.
Balancei a cabeça e fui cuidar dos meus afazeres – que eram muitos. Conversei sobre o meu dia com a Aline, uma garota que era bastante tímida e amigável - tinha mais ou menos a minha idade – e atendi várias pessoas. Eu olhei para o relógio, faltava uma hora para terminar meu expediente. Estava sem fazer nada quando alguém chegou por traz de mim tampando os meus olhos.
Era Ian e Déa, eles sempre vinham me visitar quando eu estava trabalhando.
- E aí moça!!! – cumprimentou Ian.
- Oi gente! – respondi sorridente.
Déa estava logo à frente do Ian.
- Amigaaa, nem deu pra gente conversar direito, quando o sinal bateu você foi logo embora....
Ela fez uma carinha triste no final.
- É Déa... mas é porque se eu demorasse muito, com certeza iria perder meu ônibus e eu não estava afim de ficar um tempão esperando outro, e além disso, eu poderia chegar atrasada no trabalho e – acrescentei mais baixinho – eu com certeza não iria agüentar outra reclamação da minha querida chefa né!
- Vixi amiga, esqueci desse detalhe maaaaas, mudando de assunto, você viu os alunos novos que chegaram? Meu Deus, hiperventilei!!
- Pronto, vai começar esse papo... – Ian começou a reclamar com cara feia.
- Não vi não amiga! – respondi rindo.
- Pois bem minha filha, tem um que, assim, tinha o cabelo cor de mel, com a pele bronzeada, um físico que Ave Maria!!!
Eu arregalei meus olhos.
- Mentira amiga, eu não percebi.
- Aham – alguém interrompeu. Era a minha querida chefa Grace.
- A conversa tá boa dona Letícia, mas tem trabalho esperando por você!!
Eu não respondi e revirei meus olhos automaticamente, dei graças a Deus pela Grace já estar de costas, indo para o outro lado e não ter me visto.
- Hã.... amiga, depois eu te ligo pra agente continuar a conversa eu e Ian vamos embora. Vamos Ian.
Ele não respondeu.
- Ian?
Nós duas olhamos para ele. Ele estava de boca aberta olhando para as costas da Grace, ou melhor, para a parte traseira.
- IAN!!!!!!! - Déa gritou indignada.
Com aquele grito ele pareceu voltar a si.
- O que aconteceu???
Déa balançou a cabeça e arrastou Ian para a porta.
- Tchau Lê! – Ian exclamou.
Eu acenei para os dois e suspirei, só teria de agüentar mais uma hora de trabalho e poderia ir para casa. Se eu realmente não precisasse de dinheiro para comprar as minhas coisas, nem estaria mais trabalhando aqui. Atendi mais alguns clientes e suspirei aliviada quando vi que já eram sete horas da noite. Fui o mais rápido que pude para o balcão e peguei minha mochila, não queria falar com a Grace mas percebi que ela me acompanhava pelo canto de olho. Dei um tchauzinho para Aline e fui para rua. Agradeci mentalmente ao vento que bateu no meu rosto me dando uma sensação de liberdade.

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